A Tarefa Suprema da Igreja

Allan H. McLeod

Alguns anos atrás entrei na secretaria de uma igreja e me deparei com um belo quadro na parede com estes dizeres: "O Objetivo da Igreja é a Evangelização do Mundo". Na hora senti uma forte reação -- Isso não é verdade! Perturbado em meu espírito, fiquei contemplando o quadro enquanto a secretária atendia a pessoa que estava na minha frente.

Pensei comigo mesmo: A suprema tarefa da igreja não é a evangelização do mundo. Se fosse, Jesus não poderia ter dito ao Pai: "Eu te glorifiquei na terra, consumando a obra que me confiaste para fazer" (Jo 17.4). Ele não evangelizou senão um pequeno cantinho do mundo, e então voltou ao céu deixando o vasto Império Romano envolto nas trevas do paganismo.

Os discípulos de Jesus, mesmo depois de três anos de treinamento intensivo, não evangelizaram o mundo. A igreja, que nasceu no fogo do Pentecostes, em dois mil anos de existência, ainda não cumpriu a ordem de Jesus de pregar o evangelho a toda criatura.

Através dos séculos de existência da igreja, Deus tem levantado e ungido milhares de homens e mulheres, enviando-os aos confins da terra para proclamar as boas-novas de salvação em Cristo Jesus. Pregaram o evangelho no Brasil e levantaram uma igreja que constitui mais de vinte por cento da população. Outros pregaram em países muçulmanos e ganharam tão poucas almas que o impacto sobre o Islã tem sido quase insignificante até agora.

João Batista, cheio do Espírito desde o ventre de sua mãe, certamente teria poder suficiente para pregar sua mensagem de arrependimento em todos os estádios do Império, mas não alcançou mais que algumas centenas de compatriotas antes de perder a cabeça na masmorra de Herodes. Deus não poderia ter preservado a vida dele e o levantado como o maior evangelista do primeiro século? Até os poucos discípulos que tinha o abandonaram para seguir a Jesus.

Mas João Batista mostrou sua compreensão da tarefa suprema da igreja numa das mais belas declarações de todos os tempos, quando falou: "Convêm que ele cresça e que eu diminua" (Jo 3.30). É como se dissesse: "Estou de passagem nesta terra apenas para glorificar o nome daquele que me enviou. Vou cumprir a minha pequena parte, visando à santificação do nome do Pai através da minha vida santa e da vida dos demais que se arrependeram de verdade para seguir a Jesus. Não importa se minha vida seja longa ou curta, se Deus me use muito ou pouco; o que importa é o engrandecimento do nome que está acima de todos os nomes".

Será que eu e você e os outros miIhões de irmãos nossos espalhados pelo mundo, que compõem a igreja de Cristo, entendemos a profundidade desse depoimento de João Batista?

Sem dúvida alguma, a evangelização do mundo é tarefa da igreja. Mas, não, a tarefa mais importante. Confundimos os meios com o fim. A salvação de almas, a libertação dos enfermos e oprimidos e a santificação do povo de Deus são meios pêlos quais o nome de Deus virá a ser santificado e glorificado, e não um fim em si mesmo. Não há outra explicação para a brevidade da vida de João Batista, o maior entre os nascidos de mulher, ou para o martírio de milhares de cristãos sob as mãos de Nero. Quantas pessoas cada um ganhou para Cristo, embora seja importante, não parece ser o fator prioritário do programa divino. Deus levantou Pedro e o usou para a salvação de quase três mil pessoas num só dia, mas deixou Herodes matar Tiago. Depois permitiu que João, o irmão de Tiago, vivesse até quase noventa anos. Como explicar essas coisas?

O próprio Deus encarnado estabeleceu as prioridades do Reino quando ensinou os discípulos a orar, não como os pagãos, e nem segundo sua própria agenda, mas de acordo com o propósito pré-estabelecido dele. Eu vejo os versículos de 9 a 13 de Mateus 6 como se fossem um "estatuto" da igreja. E uma declaração das principais finalidades dessa instituição divina na terra, que se divide em seis "artigos”. Os três primeiros têm a ver com os interesses primordiais de Deus, e os outros três, com os interesses e necessidades humanos. A divisão se faz da seguinte forma:

Artigo 1°. A Santificação do Nome de Deus

Artigo 2°. O Estabelecimento do Reino de Deus

Artigo 3°. A Realização da Vontade de Deus

Artigo 4°. As Necessidades Materiais do Homem

Artigo 5°. As Necessidades Sociais do Homem

Artigo 6°. As Necessidades Espirituais do Homem

Vamos pensar um pouco nos primeiros três itens. Não há nada mais importante para os filhos de Deus fazerem neste mundo do que viver de tal forma que a vida deles glorifique seu Pai que está nos céus. Esse foi o alvo supremo do Filho de Deus, e deve ser o nosso. Quantas e quantas vezes nós, o povo de Deus, temos manchado o nome santo do Senhor, através de atitudes e ações nada santas! Quantos escândalos provocados por líderes evangélicos que se macularam no lamaçal da imoralidade e, como consequência, macularam também o nome de Deus! Quantas divisões de igrejas ocasionadas pelas motivações carnais de pastores, líderes ou membros, que refletem no caráter santo do Pai! Quantas pessoas "evangelizando o mundo" com motivos mercenários, como se as motivações impuras fossem coisa de somenos! Quantos divórcios em nossas igrejas, quantas famílias destroçadas, quantos "casos" ilícitos, quanta luxúria no meio dos nossos jovens! Tudo "dessantificando" o nome do Pai! Não adianta "ganharmos" o mundo para Jesus e perder o alvo que ele mesmo estabeleceu como prioridade absoluta no reino dos céus - a santificação do nome do Pai pela vida santa de seus filhos.

Desde sua primeira investida no jardim do Éden, com o intuito de manchar e desacreditar a santidade de Deus, o diabo tem trabalhado incessantemente. E, com isso, seu objetivo primordial não é encher o inferno, e sim enaltecer-se mediante a diminuição da Pessoa de Deus.

Quando cedemos aos anseios da nossa carne, instigados por Satanás, vivemos como "carnais, andando segundo o homem", e acabamos jogando contra Deus, no time do adversário. É por isso que Deus exige que sejamos santos como ele é santo, e enviou seu Espírito para viver esta vida santa de Jesus em cada um. E é por esse mesmo motivo que o diabo luta para convencer os crentes de que isso não é tão importante assim; que Deus entende nossa fraqueza; que não vai levar em conta nossos pecados, pois sabe que não conseguimos ser santos. É a maior das mentiras dele.

Essa mensagem ainda é pregada. Há igrejas que ensinam que todos vamos pecar em pensamento, palavras e ações todo dia. Invalidamos a obra da cruz com nossos conceitos carnais. A Bíblia diz que o pecado não terá domínio sobre nós, pois não estamos mais debaixo da lei, e sim da graça (Rm 6.14). A possibilidade de pecar existe, mas a superabundante graça de Deus, operando em nós a morte e ressurreição com Cristo, nos capacita a viver sem estar constantemente pecando.

Quando vivemos cheios do Espírito de Deus e controlados por ele, conseguimos fazer a vontade de Deus aqui na terra, assim como os anjos a fazem no céu. O controle dos nossos desejos carnais pelo Espírito Santo é a resposta da oração que fazemos: "Venha o teu reino". Jesus Cristo precisa estar reinando sobre a nossa vida a fim de poder nos usar para estabelecer seu reino na vida dos outros e, no futuro, sobre o mundo inteiro.

O "estatuto" do reino será cumprido em sua totalidade, pois estaremos completamente livres do mal, vivendo em harmonia com todos e necessitados de nada. Todos os seres vivos farão a vontade do Pai. O Rei dos reis estará reinando sobre todos. E o nome do Pai será santificado e glorificado no Universo inteiro.

Esse alvo do Pai precisa ser nosso alvo hoje. Chega de vivermos para nós mesmos, visando à glória do nosso próprio nome e a realização dos nossos próprios interesses. Façamos da prioridade de Deus a nossa prioridade, e Deus se encarregará de suprir as nossas necessidades como prometeu e Mateus 6.33.

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O Pr. Allan McLeod foi missionário, professor e capelão do Seminário e Instituto Bíblico Betânia, em Altônia, PR.

 

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